A meu favor
Tenho o verde secreto dos teus olhos
Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor
O tapete que vai partir para o infinito
Esta noite ou uma noite qualquer
A meu favor
As paredes que insultam devagar
Certo refúgio acima do murmúrio
Que da vida corrente teime em vir
O barco escondido pela folhagem
O jardim onde a aventura recomeça.
Alexandre O’Neil
São crianças aquelas
Que vês ao fundo
No caminho que velas
Na trilha do mundo
Brilham os olhos
Lágrimas de amor
E abraços aos molhos
Pedaços sem dor
É amor o que vendem
E sonhos escondidos
São as coisas que sentem
São os choros sentidos
E a alegria que aprendem
No coração garantidos
Mário L. Soares
Quando você me deixou, meu bem
Me disse pra ser feliz e passar bem
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci
Mas depois, como era de costume, obedeci
Quando você me quiser rever
Já vai me encontrar refeita, pode crer
Olhos nos olhos, quero ver o que você faz
Ao sentir que sem você eu passo bem demais
E que venho até remoçando
Me pego cantando
Sem mais nem porquê
E tantas águas rolaram
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você
Quando talvez precisar de mim
'Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim
Olhos nos olhos, quero ver o que você diz
Quero ver como suporta me ver tão feliz
Chico Buarque
Eu não te tenho amor simplesmente. A paixão
Em mim não é amor; filha, é adoração!
Nem se fala em voz baixa à imagem que se adora.
Quando da minha noite eu te contemplo, aurora,
E, estrela da manhã, um beijo teu perpassa
Em meus lábios, oh! quando essa infinita graça
do teu piedoso olhar me inunda, nesse instante
Eu sinto? virgem linda, inefável, radiante,
Envolta num clarão balsâmico da lua,
A minh'alma ajoelha, trémula, aos pés da tua!
Adoro-te!... Não és só graciosa, és bondosa:
Além de bela és santa; além de estrela és rosa.
Bendito seja o deus, bendita a Providência
Que deu o lírio ao monte e à tua alma a inocência,
O deus que te criou, anjo, para eu te amar,
E fez do mesmo azul o céu e o teu olhar!...
Guerra Junqueiro
Tardes da minha terra, doce encanto,
Tardes duma pureza de açucenas,
Tardes de sonho, as tardes de novenas,
Tardes de Portugal, as tardes d’Anto,
Como eu vos quero e amo! Tanto! Tanto!...
Horas benditas, leves como penas,
Horas de fumo e cinza, horas serenas,
Minhas horas de dor em que eu sou santo!
Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,
Que poisam sobre duas violetas,
Asas leves cansadas de voar...
E a minha boca tem uns beijos mudos...
E as minhas mãos, uns pálidos veludos,
Traçam gestos de sonho pelo ar...
Florbela Espanca
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...
Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
Florbela Espanca
“De tempos a tempos é bom fecharmos os olhos, e naquele escuro dizer para nós próprios, ‘Eu sou o feiticeiro, e quando abrir os meus olhos verei o mundo que criei, e para com o qual eu, e apenas eu, sou completamente responsável.’ Lentamente, então, as pestanas abrem-se como as cortinas de um palco. E seguramente, estará lá o nosso mundo, tal e qual como o construímos.”
Richard Bach
in “A ponte para o sempre” de 1984. A tradução é minha a partir do Inglês.
Se é por mim que traço
o teu retrato,
a sobrancelha, a boca
o pensamento
É por ti, também
que já o guardo
e o demoro naquilo que eu
invento
A mão descida ali
o ombro inclinado
Os dedos descuidados
o gesto de que me lembro
Se é por mim que faço
o teu retrato
dizendo de ti mais do que
entendo
É por ti que o testemunho
e faço:
o nariz, a face dissimulando os dentes
Deixo para o fim os lábios
os olhos deste mar
com a cor do luar
a meio de Agosto
Se desvendo de ti o sol-posto
é porque vejo o coração
amar
e nada mais me dá tamanho gosto
Maria Teresa Horta
Quero apenas cinco coisas…
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o Outono
A terceira é o grave Inverno
Em quarto lugar o Verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da Primavera para que continues me olhando.
Pablo Neruda
Quando não posso contemplar teu rosto,
contemplo os teus pés.
Teus pés de osso arqueado,
teus pequenos pés duros.
Eu sei que te sustentam
e que teu doce peso
sobre eles se ergue.
Tua cintura e teus seios,
a duplicada purpura
dos teus mamilos,
a caixa dos teus olhos
que há pouco levantaram voo,
a larga boca de fruta,
tua rubra cabeleira,
pequena torre minha.
Mas se amo os teus pés
é só porque andaram
sobre a terra e sobre
o vento e sobre a água,
até me encontrarem.
Pablo Neruda
Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei-de partir
Se, ao te conhecer, e pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que ainda posso ir
Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato ainda pisa no teu
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica como que cara eu vou sair
Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei-de partir
Tom Jobim / Chico Buarque
Interpretado por Chico Buarque e Elis Regina
(foto retirada da internet - desconheço o autor)
Os teus olhos
exigindo
ser bebidos
Os teus ombros
reclamando
nenhum manto
Os teus seios
pressupondo
tantos pomos
O teu ventre
recolhendo
o relâmpago
David Mourão Ferreira
Meus lindos olhos, qual pequeno deus
Pois são divinos, de tão belos os teus.
Quem tos pintou com tal condão
Jamais neles sonhou criar tanta imensidão.
De oiro celeste,
Filhos de uma chama agreste
Astros que alto o céu revestem
E onde a tua história é escrita.
Meus lindos olhos, de lua cheia
Um esquecido do outro, a brilhar p´rá rua inteira.
Quem não conhece o teu triste fado
Não desvenda em teu riso um chorar tão magoado.
Perdões pedidos
Num murmúrio desolado
Quando o réu morava ao lado
Mais cruel não pode ser.
Este fado que aqui canto
Inspirou-se só em ti
Tu que nasces e renasces
Sempre que algo morre em ti
Quem me dera poder cantar
Horas, dias, tão sem fim
Quando pedes só pra mim
Por favor só mais um fado
Mafalda Arnauth
(foto retirada da internet - desconheço o autor)
Eu gostaria tanto,
de deitar minha cabeça
no teu colo,
pra voar nas asas
dos teus sonhos
e mergulhar no oceano
das tuas vontades.
Eu gostaria tanto,
de me embriagar
no cheiro do teu corpo,
de me queimar nas labaredas
dos teus lábios
e me banhar na poesia
dos teus olhos.
Eu gostaria tanto,
de te arrancar dos braços
do teu mundo
e convidar o raio
de uma estrela
para pintar azul
no chão da nossa rua.
Eu gostaria tanto,
das minhas mãos
brincando em teus cabelos,
até que o véu da noite se rasgasse
e o teu sorriso amanhecesse em mim.
Carlos Magno de Almeida
Aurora
Nascido do frio e da vertigem
um teimoso sol desponta em cada madrugada
com esse sol renasce também em cada homem
a esperança de um dia novo
distinto
absoluto e diferente
em que tudo pudesse acontecer
pela primeira vez
enchem-se então os olhos de espanto e de memória
e rebenta-nos uma saudade enorme do futuro
e uma sede tranquila de infinito
e em cada novo dia reaprendemos o ciclo
e em cada novo dia nos apaixonamos
e desistimos
e ressuscitamos
do enorme chão de água que nos cerca
Pedro Barroso (lido por Mário Viegas)
Menina dos olhos de água
Menina em teu peito sinto o tejo
E vontades marinheiras de aproar
Menina em teus lábios sinto fontes
De água doce que corre sem parar
Menina em teus olhos vejo espelhos
E em teus cabelos nuvens de encantar
E em teu corpo inteiro sinto feno
Rijo e tenro que nem sei explicar
Se houver alguém que não goste
Não gaste, deixe ficar
Que eu só por mim quero te tanto
Que não vai haver menina para sobrar
Aprendi nos 'esteiros' com soeiro
E aprendi na 'fanga' com redol
Tenho no rio grande o mundo inteiro
E sinto o mundo inteiro no teu colo
Aprendi a amar a madrugada
Que desponta em mim quando sorris
És um rio cheio de água lavada
E dás rumo à fragata que escolhi
Se houver alguém que não goste
Não gaste, deixe ficar
Que eu só por mim quero te tanto
Que não vai haver menina para sobrar
Pedro Barroso
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