Domingo, 14 de Fevereiro de 2010

Amor, pois que é palavra essencial

 

(Foto de Oleg Kosirev) 

 

Amor - pois que é palavra essencial

comece esta canção e toda a envolva.

Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,

reúna alma e desejo, membro e vulva.

 

Quem ousará dizer que ele é só alma?

Quem não sente no corpo a alma expandir-se

até desabrochar em puro grito

de orgasmo, num instante de infinito?

 

O corpo noutro corpo entrelaçado,

fundido, dissolvido, volta à origem

dos seres, que Platão viu completados:

é um, perfeito em dois; são dois em um.

 

Integração na cama ou já no cosmo?

Onde termina o quarto e chega aos astros?

Que força em nossos flancos nos transporta

a essa extrema região, etérea, eterna?

 

Ao delicioso toque do clitóris,

já tudo se transforma, num relâmpago.

Em pequenino ponto desse corpo,

a fonte, o fogo, o mel se concentraram.

 

Vai a penetração rompendo nuvens

e devassando sóis tão fulgurantes

que nunca a vista humana os suportara,

mas, varado de luz, o coito segue.

 

E prossegue e se espraia de tal sorte

que, além de nós, além da própria vida,

como activa abstracção que se faz carne,

a ideia de gozar está gozando.

 

E num sofrer de gozo entre palavras,

menos que isto, sons, arquejos, ais,

um só espasmo em nós atinge o climax:

é quando o amor morre de amor, divino.

 

Quantas vezes morremos um no outro,

no húmido subterrâneo da vagina,

nessa morte mais suave do que o sono:

a pausa dos sentidos, satisfeita.

 

Então a paz se instaura. A paz dos deuses,

estendidos na cama, qual estátuas

vestidas de suor, agradecendo

o que a um deus acrescenta o amor terrestre.

 

Carlos Drummond de Andrade

 

publicado por Lagash às 16:04
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Sexta-feira, 12 de Fevereiro de 2010

Perdoa-me

 

 

Perdoa-me por tudo o que te fiz.

Perdoa-me o que não te fiz.

O perdão é importante questão.

E também seja levante o esquecimento.

O amor é eterno como o firmamento

externo e o lamento.

Perdão te peço de todo o meu fundo.

Perdão que não meço do tamanho do mundo.

Esquecer é preciso…

 

Sejam ventos os pensamentos

que apenas passam.

Levam o tempo que

no momento lavram.

 

Esqueço-me de mim e arrefeço-me.

Pertenço ao querer e ao lenço.

Vivo na história da memória do meu livro.

Esqueço da dor,

lembro o fervor do amor.

Perco-me em mim no labirinto

que sinto.

Sou forte e olho de frente

a morte pendente.

Espero a sorte que note

que vi e que estou aqui.

 

Oh, vida, que não queres perdão

perdida assim p’lo chão.

Nascida de azul berço,

Que mereço ser querida.

 

Perdoa-me vida. Perdoa-me sorte.

 

Perdoa-me a morte.

 

Mário L. Soares

 

publicado por Lagash às 16:11
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Domingo, 7 de Fevereiro de 2010

A meu favor

 

 

A meu favor

Tenho o verde secreto dos teus olhos

Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor

O tapete que vai partir para o infinito

Esta noite ou uma noite qualquer

 

A meu favor

As paredes que insultam devagar

Certo refúgio acima do murmúrio

Que da vida corrente teime em vir

O barco escondido pela folhagem

O jardim onde a aventura recomeça.

 

Alexandre O’Neil

 

publicado por Lagash às 16:07
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Sábado, 6 de Fevereiro de 2010

Viverei

 

("O beijo" de Alfred Eisenstaedt)

 

Viverei o que sinto

Com amor em promontório

Saberás que não minto

No fim, no meu velório

 

Abrirei os braços

E no túnel gritarei

A todos os meus laços

Por quem me enamorei

 

Se em enleios me perder

A luz do destino granjearei

Para não me deixar morrer

 

Serei, no caminho, feliz comigo

E ao universo sorrirei

A minha vida contigo

 

Mário L. Soares

 

publicado por Lagash às 16:15
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Segunda-feira, 1 de Fevereiro de 2010

São crianças

 

 

São crianças aquelas

Que vês ao fundo

No caminho que velas

Na trilha do mundo

 

Brilham os olhos

Lágrimas de amor

E abraços aos molhos

Pedaços sem dor

 

É amor o que vendem

E sonhos escondidos

São as coisas que sentem

 

São os choros sentidos

E a alegria que aprendem

No coração garantidos

 

Mário L. Soares

 

publicado por Lagash às 16:19
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Sábado, 30 de Janeiro de 2010

Hora Nostálgica #30 - Olhos nos olhos

 

 

Quando você me deixou, meu bem

Me disse pra ser feliz e passar bem

Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci

Mas depois, como era de costume, obedeci

 

Quando você me quiser rever

Já vai me encontrar refeita, pode crer

Olhos nos olhos, quero ver o que você faz

Ao sentir que sem você eu passo bem demais

 

E que venho até remoçando

Me pego cantando

Sem mais nem porquê

E tantas águas rolaram

Quantos homens me amaram

Bem mais e melhor que você

 

Quando talvez precisar de mim

'Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim

Olhos nos olhos, quero ver o que você diz

Quero ver como suporta me ver tão feliz 

 

Chico Buarque

 

publicado por Lagash às 16:27
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Sexta-feira, 29 de Janeiro de 2010

O sexo é sagrado...

 

 

O sexo é sagrado,

como salgadas são as gotas de suor

que brotam dos meus poros

e encharcam nossas peles.

A noite é meu templo

onde me torno uma deusa enlouquecida

sentindo teus pelos sobre a minha pele.

Neste instante já não sou nada,

somente corpo,

boca,

pele,

pêlos,

línguas,

bocas.

E a vida brota da semente,

dos poucos segundos de êxtase.

Tuas mãos como um brinquedo

passeiam pelo meu corpo.

Não revelam segredos

desvendam apenas o pudor do mundo,

descobrem a febre dos animais.

Então nos tornamos um

ao mesmo tempo em que

a escuridão explode em festa.

A noite amanhece sem versos,

com a música do seu hálito ofegante.

O sol brota de dentro de mim.

Breves segundos.

Por alguns instantes dispo-me do sofrimento.

Eu fui feliz.

 

Cláudia Marczak

 

publicado por Lagash às 16:13
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Terça-feira, 26 de Janeiro de 2010

Adoração

 

 

Eu não te tenho amor simplesmente. A paixão

Em mim não é amor; filha, é adoração!

Nem se fala em voz baixa à imagem que se adora.

Quando da minha noite eu te contemplo, aurora,

E, estrela da manhã, um beijo teu perpassa

Em meus lábios, oh! quando essa infinita graça

do teu piedoso olhar me inunda, nesse instante

Eu sinto? virgem linda, inefável, radiante,

Envolta num clarão balsâmico da lua,

A minh'alma ajoelha, trémula, aos pés da tua!

Adoro-te!... Não és só graciosa, és bondosa:

Além de bela és santa; além de estrela és rosa.

Bendito seja o deus, bendita a Providência

Que deu o lírio ao monte e à tua alma a inocência,

O deus que te criou, anjo, para eu te amar,

E fez do mesmo azul o céu e o teu olhar!...

 

Guerra Junqueiro

 

publicado por Lagash às 16:17
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Sábado, 23 de Janeiro de 2010

Soneto do Amor Total

 

 

Amo-te tanto, meu amor... não cante

O humano coração com mais verdade...

Amo-te como amigo e como amante

Numa sempre diversa realidade.

 

Amo-te afim, de um calmo amor prestante

E te amo além, presente na saudade

Amo-te, enfim, como grande liberdade

Dentro da eternidade e a cada instante.

 

Amo-te como um bicho, simplesmente

De um amor sem mistério e sem virtude

Com um desejo maciço e permanente

 

E de te amar assim, muito e amiúde

É que um dia em teu corpo, de repente

Hei-de morrer de amar mais do que pude.

 

Vinicius de Moraes

 

publicado por Lagash às 16:23
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Quinta-feira, 21 de Janeiro de 2010

Quem disse que não temos talentos? #30 A Marte

 

 

Acordei de manhã

Ainda meio baralhado

De teres sido tu a estrela

Daquele filme alugado

 

Deixámos o Bruce Lee

Entregue às artes marciais

Quando olhaste para mim

Sem efeitos especiais

 

A Marte, vou a Marte

Se é o que tu queres

Eu vou a Marte!

 

Fui ter contigo ao café

Não me cansei de olhar para ti

Disseste mata-me a sede

Tira-me daqui

 

E o mercúrio subiu

E eu não sou de pedra

P’ra uma Vénus como tu

Não há água nesta terra!

 

A Marte, vou a Marte

Se é o que tu queres

Eu vou a Marte!

 

Estou em terra

Se não me engano

Fizeste de mim

Um verdadeiro marciano

 

A Marte, vou a Marte

Se é o que tu queres

Eu vou a Marte!

 

João Só e Abandonados

 

publicado por Lagash às 16:01
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Segunda-feira, 18 de Janeiro de 2010

A vida

 

(Colorado Headwaters Fall) 

 

A vida

às portas da vida

 

e o azul masculino de um rio

 

Amor Ardente

de forma distinta

 

Mário Cesariny de Vasconcelos

 

publicado por Lagash às 16:25
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Quinta-feira, 14 de Janeiro de 2010

Felicidade

 

 

Pela flor pelo vento pelo fogo

Pela estrela da noite tão límpida e serena

Pelo nácar do tempo pelo cipreste agudo

Pelo amor sem ironia – por tudo

Que atentamente esperamos

Reconheci a tua presença incerta

Tua presença fantástica e liberta

 

Sophia de Mello Breyner Andresen

 

publicado por Lagash às 16:13
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Sábado, 9 de Janeiro de 2010

Octapodi

 

 

Nada, nem ninguém consegue separar o amor!

 

Vai, e luta por quem queres e por aquilo que acreditas!

 

Uma fantástica animação de Julien Bocabeille, François-Xavier Chanioux, Olivier Delabarre, Thierry Marchand, Quentin Marmier e Emud Mokberi.

 

Mário L. Soares

 

publicado por Lagash às 16:18
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Sexta-feira, 8 de Janeiro de 2010

Languidez

 

("Jove Decadente" por Ramon Casas, 1910) 

 

 

Tardes da minha terra, doce encanto,

Tardes duma pureza de açucenas,

Tardes de sonho, as tardes de novenas,

Tardes de Portugal, as tardes d’Anto,

 

Como eu vos quero e amo! Tanto! Tanto!...

Horas benditas, leves como penas,

Horas de fumo e cinza, horas serenas,

Minhas horas de dor em que eu sou santo!

 

Fecho as pálpebras roxas, quase pretas,

Que poisam sobre duas violetas,

Asas leves cansadas de voar...

 

E a minha boca tem uns beijos mudos...

E as minhas mãos, uns pálidos veludos,

Traçam gestos de sonho pelo ar...

 

Florbela Espanca

 

publicado por Lagash às 16:27
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Quinta-feira, 7 de Janeiro de 2010

Carne de amor

 

 

Carne. Carne de amor. Love-flesh,

como lhe chamou Whitman.

Amada carne até aos bordos cheia

de ardor, fremente de seiva.

Carne endurecida

até à alma. Erecta carne

profunda. Vertical esplendor

subindo às estrelas. Ou mais

alto ainda. Talvez

à eternidade.

Ámen.

 

Eugénio de Andrade

 

publicado por Lagash às 16:18
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Declaração

Declaro que a responsabilidade de todos os textos / poesia / prosa publicados é minha no respeitante à transcrição dos mesmos. Faço todos os possíveis para contactar o(s) autor(es) dos trabalhos a fim de autorizarem a publicação, na impossibilidade de o fazer, caso assim o entenda o autor ou representante legal deverá contactar-me a fim de que o mesmo seja retirado - o que será feito assim que receba a informação. Os trabalhos assinados "Mário L. Soares" são de minha autoria e estão protegidos com a lei dos direitos de autor vigente. Quanto às fotografias, todas, cujo autor não esteja identificado, são de "autor desconhecido" - caso surja o respectivo autor de alguma, queira por favor contactar-me para proceder à sua identificação e se for caso disso retirada do blog. Às restantes fotografias aplicarei o mesmo princípio dos trabalhos escritos. Obrigado. Mário L. Soares - lagash.blog@sapo.pt

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