Bebido o luar, ébrios de horizontes,
Julgamos que viver era abraçar
O rumor dos pinhais, o azul dos montes
E todos os jardins verdes do mar.
Mas solitários somos e passamos,
Não são nossos os frutos nem as flores,
O céu e o mar apagam-se exteriores
E tornam-se os fantasmas que sonhamos.
Por que jardins que nós não colheremos,
Límpidos nas auroras a nascer,
Por que o céu e o mar se não seremos
Nunca os deuses capazes de os viver.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Como a vida reveses traz!
Olhar para dentro à frente
Saber usar a bem a mente
E viver o sonho e ser capaz.
Aguardo no mar as bonanças,
Que a tempestade ao fundo augura;
Sabendo que na noite escura
Vêm ventos e mudanças.
Ah, raios e coriscos que se partam!
Quero ver o sol na meia-noite
Ter a luz – que os céus se abram!
Contrariedades que se vão!
Serei herói e homem do leme,
Neste mundo que é um cão.
Mário L. Soares
Fluxo e refluxo eterno...
João de Deus.
Dorme a noite encostada nas colinas.
Como um sonho de paz e esquecimento
Desponta a lua. Adormeceu o vento,
Adormeceram vales e campinas...
Mas a mim, cheia de atracções divinas,
Dá-me a noite rebate ao pensamento.
Sinto em volta de mim, tropel nevoento,
Os Destinos e as Almas peregrinas!
Insondável problema!... Apavorado
Recua o pensamento!... E já prostrado
E estúpido à força de fadiga,
Fito inconsciente as sombras visionárias,
Enquanto pelas praias solitárias
Ecoa, ó mar, a tua voz antiga.
Antero de Quental
Tu perguntas, e eu não sei,
eu também não sei o que é o mar.
É talvez uma lágrima caída dos meus olhos
ao reler uma carta, quando é de noite.
Os teus dentes, talvez os teus dentes,
miúdos, brancos dentes, sejam o mar,
um mar pequeno e frágil,
afável, diáfano,
no entanto sem música.
É evidente que a minha mãe me chama
quando uma onda e outra onda e outra
desfaz o seu corpo contra o meu corpo.
Então o mar é carícia,
luz molhada onde desperta meu coração recente.
Às vezes o mar é uma figura branca
cintilando entre os rochedos.
Não sei se fita a água
ou se procura
um beijo entre conchas transparentes.
Não, o mar não é nardo nem açucena.
É um adolescente morto
de lábios abertos aos lábios de espuma.
É sangue,
sangue onde a luz se esconde
para amar outra luz sobre as areias.
Um pedaço de lua insiste,
insiste e sobe lenta arrastando a noite.
Os cabelos da minha mãe desprendem-se,
espalham-se na água,
alisados por uma brisa
que nasce exactamente no meu coração
O mar volta a ser pequeno e meu,
anémona perfeita, abrindo nos meus dedos.
Eu também não sei o que é o mar.
Aguardo a madrugada, impaciente,
os pés descalços na areia.
Eugénio de Andrade
Tu serás o princípio
e o meu fim
Pegando mar de amor
a chama alta
Vulcão em desacerto
e fogo posto
Tão grande que ele é
e já me mata
Maria Teresa Horta
Onda a onda o desejo no
teu rosto de mágoas e de torres
levemente descaídas para
onde não sei se nasces ou se morres
quando os meus dedos cítara a cítara
tocam a música do teu corpo nu
lá onde os teus mistérios serão meus
e chegarei às margens onde tu
talvez então me digas quem é Deus.
Manuel Alegre
O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar.
Carlos Drummond de Andrade
Que jaz no abismo sob o mar que se ergue?
Nós, Portugal, o poder ser.
Que inquietação do fundo nos soergue?
O desejar poder querer.
Isto, e o mistério de que a noite é o fausto...
Mas súbito, onde o vento ruge,
O relâmpago, farol de Deus, um hausto
Brilha, e o mar ‘scuro ‘struge.
Fernando Pessoa
in Mensagem
Se é por mim que traço
o teu retrato,
a sobrancelha, a boca
o pensamento
É por ti, também
que já o guardo
e o demoro naquilo que eu
invento
A mão descida ali
o ombro inclinado
Os dedos descuidados
o gesto de que me lembro
Se é por mim que faço
o teu retrato
dizendo de ti mais do que
entendo
É por ti que o testemunho
e faço:
o nariz, a face dissimulando os dentes
Deixo para o fim os lábios
os olhos deste mar
com a cor do luar
a meio de Agosto
Se desvendo de ti o sol-posto
é porque vejo o coração
amar
e nada mais me dá tamanho gosto
Maria Teresa Horta
Espírito que passas, quando o vento
Adormece no mar e surge a Lua,
Filho esquivo da noite que flutua,
Tu só entendes bem o meu tormento...
Como um canto longínquo – triste e lento –
Que voga e subtilmente se insinua,
Sobre o meu coração, que tumultua,
Tu vertes pouco a pouco o esquecimento...
A ti confio o sonho em que me leva
Um instinto de luz, rompendo a treva,
Buscando, entre visões, o eterno Bem.
E tu entendes o meu mal sem nome,
A febre de Ideal, que me consome,
Tu só, Génio da Noite, e mais ninguém!
Antero de Quental
Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.
Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.
Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.
Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exalação afirmativa.
Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre.
Sophia de Mello Breyner Andresen
(Mia Couto - foto de Alfredo Cunha)
Na vertigem do oceano
vagueio
sou ave que com o seu voo
se embriaga
Atravesso o reverso do céu
e num instante
eleva-se o meu coração sem peso
Como a desamparada pluma
subo ao reino da inconstância
para alojar a palavra inquieta
Na distância que percorro
eu mudo de ser
permuto de existência
surpreendo os homens
na sua secreta obscuridade
transito por quartos
de cortinados desbotados
e nas calcinadas mãos
que esculpiram o mundo
estremeço como quem desabotoa
a primeira nudez de uma mulher
Mia Couto – Setembro 1980
(Machico - Ilha da Madeira)
O som do mar
Nas ondas do tempo
Que eu vejo passar
P’las asas do vento
Olho p’ra frente
A luz traz-me a cegueira
Vou para Oriente
Viro costas à Madeira
Mário L. Soares
(costa norte da ilha da Madeira)
Madeira, jardim no Atlântico plantada,
Que bela és, romântica estada...
Belas as montanhas, praias, flores,
Lindos os campos, as pessoas e amores,
O mar, o teu amante,
A altura das montanhas, impressionante,
O ar puro, água e o sol sem igual,
A vida no seu melhor, real.
Peixe, carne, imagens e calma...
Férias, na essência da alma...
Mário L. Soares
(Rochas, da autoria do Bentes)
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, em “Mensagem”
Sitios interessantes (ou não)
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Não asses mais carapaus fritos
PCP - Partido Comunista Português
PSD - Partido Social Democrata
Vida de um Português - grande brother!
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